Eu sou super fã de Walcyr Carrasco!
Na edição de 20 de abril de 2011 da revista Veja São Paulo ele publicou uma crônica que me chamou muita atenção e achei super digno compartilhar aqui no blog.
O texto e a imagem foram retirados do site da Veja São Paulo.
Certa vez participei da seleção de meninas para uma novela infantil. Havia uma fila que dobrava o quarteirão, formada unicamente por mães e filhas, estas entre 5 e 12 anos de idade. A maioria esmagadora vestia-se com saias curtíssimas, tops, botinhas ou sandálias. Figurino que se esperaria num show de vedetes. O teste incluía um número de dança e canto. Surpreso, assisti às garotinhas rebolando e cantando músicas com insinuações maliciosas. E nós, que estávamos procurando uma personagem romântica, não sabíamos como escolher. Eu pensava: que mães são essas que trazem suas meninas vestidas desse jeito? Cantando e dançando assim? Fiquei bastante chocado na época.
Acho normal que meninas queiram imitar as mães. Já vi garotinhas se equilibrando em cima de sapatos de salto, com o rosto borrado de batom, após atacar o armário e a penteadeira maternos. Meninos também gostam de se vestir como os pais. Eu mesmo, quando criança, me senti orgulhosíssimo quando ganhei meu primeiro terninho com gravata. Um adulto!
Mas eu não consigo entender os pais de hoje em dia. Compram ovos de Páscoa, coelhinhos de chocolate e falam das belezas da infância. Já soube de pais revoltados com escolas por terem adotado livros com um mínimo de ousadia. ONGs tratam de defender as crianças da exposição a temas violentos ou eróticos nos meios de comunicação. Mas não conheço nenhuma que critique a moda infantil. Mais que isso: os pais parecem gostar dela.
E os valores do universo adulto se refletem no jeito de vestir dos filhos.
As grifes se tornaram um pretexto para o bullying. Nas escolas frequentadas pelos filhos dos muito ricos, há uma competição para ver quem tem o melhor relógio, tênis e camiseta. Ou, no caso das meninas, também bolsa, maquiagem e joia. Os um pouquinho menos ricos são desprezados por não possuir este ou aquele objeto de consumo. Sempre aconselho a amigos que vão escolher escolas para seus pimpolhos:
— Não pense apenas na que tem o melhor padrão de ensino, mas na que lida bem com as diferenças sociais.
Já vi certa mãe desfilando com sua menina vestida de negro e a boca vermelhíssima.
— É fashion! — explicou.
Alguma criança fica à vontade num vestido? Tudo bem que se queira causar estranheza. Mas à custa da filha? Nem que fosse a família do conde Drácula!
Assisto admirado à crescente “adultização” da moda infantil. E, em consequência, sua sensualização. Li, recentemente, sobre a venda de sutiãs com enchimento para meninas com menos de 10 anos de idade. Podem me chamar de antiquado, mas o que há na cabeça das mães que vestem suas meninas assim?
Em geral, quando se toca no tema, a resposta é genérica.
— É culpa da moda! — disse uma amiga.
Como se a moda fosse uma entidade à parte, à qual devêssemos obediência absoluta. Mas a moda somos nós. Ninguém produziria essas peças se não houvesse quem as comprasse.
Ainda acredito que cada fase da vida deve ser vivida em seu esplendor. A infância é um momento de formação. De descoberta e construção de valores para a vida. Sei que os pais agem de maneira inocente. A não ser em casos muito raros, não há intenção malévola. Mas o que esperar dessas crianças que desde cedo são levadas a exercer a sensualidade? E a que riscos estão expostas?
Às vezes, acho que deveria haver uma escola para pais.
Walcyr Carrasco
Concordo, Walcyr!
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